Petrópolis foi a cidade com mais deslizamentos no Brasil em 2024
Especialista explica os motivos para que a cidade esteja tão suscetível aos desastre ambientais; saiba também o que vem sendo feito pelo poder público
Um apanhado do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), aponta que, em 2024, Petrópolis foi a cidade com mais ocorrências de desastres geológicos (deslizamentos) e hidrológicos (enchentes) em todo o Brasil.
Foto: arquivo – Fernanda Marinho
A cidade ocupa o pódio com Salvador (BA), onde foram registradas 33 ocorrências, e São Paulo (SP), com 27. A única outra cidade do Rio a estar no top 10 é Teresópolis, no 5° lugar. A maioria dos casos em Petrópolis foram de movimentação de terra, 29, enquanto os que envolvem água somaram 15.
Vale ressaltar que estes números representam os incidentes que impactaram diretamente as populações das cidades, e não os que ocorreram exclusivamente na natureza. Alguns exemplos são quedas de barreira que interferiram nas estradas ou acertaram residências e até mesmo eventos que levaram a óbitos.
Foto: Divulgação Cemaden
Mas por que Petrópolis é tão suscetível aos desastres ambientais?
Para Pedro Camarinha, pesquisador especialista em Geodinâmica e Geologia de Desastres do Cemaden, a propensão de Petrópolis às tragédias ambientais se dá por uma série de fatores. A começar pela suscetibilidade da Região Serrana do Rio no que diz respeito aos deslizamentos.
“Petrópolis tem uma geomorfologia, que é a forma com que o relevo foi se moldando ao longo do tempo, que favorece isso. Então temos escarpas muito grandes, vales muito encaixados, encostas muito íngremes, que já favorecem esse tipo de fenômeno naturalmente. Mas não podemos deixar de falar da interferência humana, em especial, da ocupação irregular nessas regiões mais íngremes, que interferem na estabilidade das encostas. E, eventualmente, quando esses deslizamentos acontecem, eles impactam essas populações. É aí que está o problema”, alerta.
Dentre as interferências citadas por ele estão os cortes irregulares nas encostas, vazamentos de tubulações de água, lançamentos de esgoto ou de águas pluviais de maneira inadequada, entre outros. “A cidade foi se estabelecendo dessa forma e hoje temos muitas casas localizadas diretamente ou logo abaixo de encostas. Ou seja, existem muitas pessoas expostas a esses deslizamentos”.
Morro da Oficina, 2022/ Foto: Florian PlaucheurAFP
Tempestades tendem a se formar rapidamente na cidade
O pesquisador ressalta ainda que algumas tempestades específicas se desenvolvem de maneira muito rápida e dinâmica em Petrópolis, favorecendo esses desastres.
“Petrópolis tem uma área muito grande, mas se localiza bem próximo à face da Serra que está virada para o Rio de Janeiro e o Oceano Atlântico. Então, quando vem um vento do Sul, normalmente durante a passagem de uma frente fria, ele interage com as montanhas, se encaixa ali e, com alguns outros condicionantes, as tempestades se tornam muito intensas, trazendo volumes significativos”, explica.
Foto arquivo: Marianny Mesquita
E o que pode ser feito para evitar estes impactos negativos?
Estes são os motivos que colocam Petrópolis como uma das cidades com mais propensão a deslizamentos e enchentes que causem impactos na população. Mas o que pode ser feito para evitar isto?
Para o geólogo, o poder público deve realizar algumas ações específicas, dentre elas a contenção de encostas em regiões críticas, utilizando mecanismos de engenharia que permitem com que essas encostas se tornem mais estáveis, colocando drenos subsuperfície ou em porções mais fundas do solo, que ajudam a água a sair de dentro desses locais, além do concretamento com solos grampeados.
“Outras soluções seriam aquelas baseadas na natureza, com o replantio de algumas espécies como a vetiver, que facilita a contenção dessas encostas. Isso vai ajudar a ocupação urbana a não avançar nesse sentido e vai mitigar as questões de escoamento superficial da água”, exemplifica.
Foto: Divulgação
Ocupação irregular é uma das principais causas das tragédias
O especialista do Cemaden aponta ainda que o respeito aos códigos florestais, a não ocupação de determinadas regiões e a realocação de pessoas que vivem em áreas críticas para áreas seguras e dignas são de extrema importância.
“Petrópolis tem se mostrado uma cidade com muitas iniciativas para mitigar os desastres. Mas é importante lembrar que as soluções podem e devem ser múltiplas. Porque, se a gente foca só em um deles, hora ou outra essas soluções podem falhar ou não serem suficientes em todo o território e a gente vai ter mais tragédias acontecendo”, afirma.
Pedro acrescenta que a educação ambiental, criando uma percepção de risco na população; a capacitação da Defesa Civil, com sistema de alarme, rotas de fuga bem estabelecidas e abrigos preparados; e a implementação de tecnologias de sistemas de alertas como o do Cemaden e os do próprio estado e Petrópolis, investindo na detecção desses eventos e diminuindo os falsos alarmes, também são chaves principais desse processo.
“Obviamente os deslizamentos e enchentes continuarão acontecendo, isso faz parte da natureza da região, é inevitável que uma residência seja atingida ou vias sejam obstruídas. Mas o principal objetivo tem que ser o de salvar vidas e esse tipo de impacto pode ser sanado quando essas diferentes soluções são implementadas ao longo do tempo”, finaliza.
Foto: Sou Petrópolis
O que diz a Prefeitura de Petrópolis sobre isso?
Sistema de alerta
De acordo com a Prefeitura, o município conta com um sistema de alerta e alarmes com 22 sirenes (no primeiro e terceiro distritos) e o sistema Cell Broadcast. Além disso, há duas cancelas na Rua Coronel Veiga e na região da Ponte Fones.
A Secretaria de Proteção e Defesa Civil monitora o Rio Quitandinha pelas câmeras do Centro Integrado de Monitoramento de Operação de Petrópolis (Cimop). Quando constata o risco de inundação da Rua Coronel Veiga, a Defesa Civil aciona automaticamente as 2 cancelas, para impedir que motoristas e pedestres entrem em áreas inundadas.
Foto: Divulgação PMP
Nudecs
Para o fortalecimento da cultura da prevenção nas comunidades, o trabalho é feito em conjunto com os Núcleos Comunitários de Defesa Civil (Nudecs). O Nudec é um grupo formado por agentes da Secretaria de Defesa Civil, lideranças comunitárias e moradores.
Um espaço para debater medidas de prevenção a desastres e de preparação às fortes chuvas do verão. Além disso, um espaço onde os moradores e as lideranças passam por capacitações da Defesa Civil, para que saibam como ajudar suas comunidades a ficar mais seguras.
Ilhas de segurança
Outra medida para aumentar a segurança de motoristas e pedestres ao longo do Rio Quitandinha são as ilhas de segurança. São 15 ilhas de segurança, entre a Ponte Fones e a Rua Paulo Barbosa.
Essas ilhas são pontos seguros para onde as pessoas devem ir em caso de inundação do Rio Quitandinha. Elas estão demarcadas por faixas vermelhas no chão e placas nos postes.
Foto: Divulgação
Cartilha do que fazer em caso de chuvas fortes
A população também pode ter acesso ao Plano de Resiliência Individual (PRI), uma cartilha, com orientações do que fazer em dias de fortes chuvas.
Ali, há orientações sobre os avisos da Defesa Civil, o que colocar na mochila de emergência, dicas de segurança para inundações, dicas de segurança para deslizamentos, dicas de prevenção aos acidentes domésticos, rotas de fuga, endereços dos pontos de apoio, entre outras orientações.
O PRI pode ser acessado clicando aqui.
Obras
Com relação às obras, a Prefeitura está em busca de parcerias com o Estado e o Governo Federal para a realização de obras de prevenção em outros pontos da cidade.
Planos de redução de riscos
A cidade também conta com o Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR), o Plano de Contingência para chuvas intensas e o Plano Verão 2024/205 – que está sendo atualizado.
Outra medida foi a parceria entre a Prefeitura e o Departamento de Recursos Minerais do Estado do Rio de Janeiro (DRM-RJ) que instalou na sede da Secretaria de Proteção e Defesa Civil um Núcleo Avançado para que geotécnicos do Departamento possam atuar em caso de ocorrências referentes às chuvas.
Foto: Divulgação
Ações do Governo do Estado
Investimentos
De acordo com o Governo do Estado, dos cerca de R$ 4.5 bilhões que o órgão investiu em obras em todo o RJ, mais de R$ 700 milhões foram direcionados para intervenções em Petrópolis. Somente pela Secretaria de Infraestrutura e Obras Públicas, foram investidos R$ 275,3 milhões, em obras de infraestrutura e prevenção, além de intervenções emergenciais por conta da calamidade de 2022.
Túnel Extravasor
O Túnel Extravasor, por exemplo, que não passava por manutenção desde que foi construído pelo governo federal em 1960, teve toda a sua estrutura reforçada. A primeira etapa das obras foi concluída em abril de 2024. E mais de 90% da segunda etapa das obras já estão finalizadas. No total, as duas etapas somam um investimento de R$ 78,8 milhões.
Foto: Divulgação
Outras ações
Além disso, o Governo do Estado criou o Posto Avançado de Petrópolis – um gabinete regional que é ativado para otimizar resposta aos desastres naturais na Região Serrana. A iniciativa visa ao enfrentamento de eventos extremos provocados por mudanças climáticas.
O Governo do Estado, por meio do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ), também vem promovendo, nos últimos anos, o maior reforço operacional da história da corporação, com a aquisição de viaturas e equipamentos de última geração, um investimento de mais de R$ 1 bilhão.
Em Petrópolis, a corporação reforçou o 15º GBM e seus Destacamentos com mais de 2.090 equipamentos operacionais e de proteção individual. Petrópolis também foi beneficiada com viaturas novas, incluindo uma picape para resposta rápida a ocorrências diversas, um veículo de recolhimento de cadáveres e uma ambulância de última geração. O 15º GBM é a unidade operacional com o maior efetivo da Região Serrana, com 105 bombeiros militares.
A Secretaria de Estado de Defesa Civil do Rio de Janeiro (SEDEC-RJ) informa que todas as 20 sirenes da cidade de Petrópolis estão funcionando perfeitamente e podem ser acionadas via rádio, internet ou manualmente. Esse sistema de sirenes tem o custo anual em torno de R$ 500 mil.