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Após as tragédias, fotógrafa de Petrópolis evidencia em imagens a realidade dos bairros atingidos

História

Após as tragédias, fotógrafa de Petrópolis evidencia em imagens a realidade dos bairros atingidos

Em suas redes sociais, Mariana Rocha vem publicando as fotos dos bairros, como Alto da Serra e Rua Teresa, que sofreram fortes impactos durante as chuvas de fevereiro e março

A expressão “uma imagem fala mais que mil palavras” nunca fez tanto sentido quanto na época das tragédias de Petrópolis neste ano. Os cenários desoladores registrados pelas fotos que repercutiram por todo o Brasil foram impactantes e recheados de significado.

Algumas dessas fortes imagens foram feitas pela petropolitana Mariana Rocha. E hoje, 19 de agosto, Dia Mundial da Fotografia, a artista por trás das lentes que estão mostrando a realidade de Petrópolis irá contar mais sobre o seu trabalho e a importância da fotografia para o registro da história.

Fotos: @maridcrocha

O começo de tudo

Fotógrafa desde 2010, Mariana iniciou sua trajetória como muitos fotógrafos petropolitanos, com cliques de cenários e situações da Cidade Imperial.

Por ter fortes laços com artistas musicais e teatrais, passou a fotografar shows de bandas petropoltianas, além de festivais de teatro e palhaçaria no Rio de Janeiro, mantendo sempre o foco na cultura.

Alguns de seus últimos trabalhos foram o registro da visita da ONG “Palhaços sem fronteira” nos bairros atingidos pelas chuvas em Petrópolis, além de também ter fotografado o show da cantora IZA na cidade.  Porém, foi com a cobertura da tragédia e dos impactos posteriores que Mariana ganhou maior notoriedade.

Cobertura dos Palhaços Sem Fronteira e do Show da IZA em Itaipava / Fotos: @maridcrocha

Trabalho na tragédia

Na época em que as tragédias aconteceram, um sentimento em comum entre todos que estavam na cidade era o de tentar ser útil. Mariana então começou a fazer alguns trabalhos voluntários, ajudando com a organização das doações e indicando quais locais precisavam.

Após um tempo, ela foi percebendo que as fotos poderiam servir como um registro importante para não deixar o ocorrido cair no esquecimento. “É importante, pelo tamanho do que aconteceu, que a gente não cometa o erro de esquecer, como fizemos em outros momentos, e hoje vemos o que poderia ser evitado, se repetir”, refletiu.

Rua Washington Luis no dia 22 de março / Fotos: @maridcrocha

Em 2011, durante a tragédia que atingiu, em especial, o Vale do Cuiabá, Mariana havia feito um trabalho parecido com o deste ano. “Mas as redes sociais não tinham o peso que elas têm hoje, então não aconteceu essa propagação como dessa vez”.

Ver que o que aconteceu em 2011 estava acontecendo de novo, e que nada havia sido solucionado mais de 10 anos depois, foi outro impulso para memorizar tudo. “Esse impacto que as fotografias causaram é importante para esse registro de memória, mas também para mostrar a evolução das coisas. Voltei meses depois nos lugares e víamos que a situação permanecia a mesma. Um cenário desolador”, apontou.

Chácara Flora no dia 12 de junho, quase quatro meses após as primeiras chuvas / Fotos: @maridcrocha

Antes e depois

Moradora do Sargento Boening durante grande parte da sua vida, Mariana conhecia bem os bairros atingidos e conseguiu entender a dimensão do acontecido. Disso, veio a ideia de fazer comparações com o “antes e o depois” dos locais.

Através do Google Maps, a fotógrafa comparou as fotos que havia feito, com os registros de como eram esses locais antes, para que todos entendessem a dimensão da tragédia.

Antes e depois da Rua Teresa / Fotos: Google Maps e @maridcrocha

Morro da Oficina

Em 2021, a fotógrafo havia realizado um livro de memórias dos moradores do Morro da Oficina, juntamente com o Projeto Redesencontros e o Projeto do Morro. Durante esse trabalho, Mariana fez muitas fotos do bairro, em especial, das casas e da vista da Paróquia Santo Antônio. Essas imagens a ajudaram a fazer as comparações e mensurar a quantidade de casas atingidas.

Uma conexão muito forte com o lugar e com as pessoas que ali viviam foi criada por Mariana. Algumas das pessoas que participaram do trabalho cultural realizado no bairro vieram a óbito pela tragédia. “Fiquei muito sensibilizada pessoalmente pela situação. [Fotografar essas áreas] era uma forma também de honrar a memória dessas pessoas”, comentou.

O maior medo da petropolitana é que as pessoas esqueçam de tudo pelo que a cidade passou. “É muito importante que essas imagens não caiam no esquecimento, para que a gente se lembre das pessoas que viveram ali, que perderam seus familiares e suas casas”, ressaltou.

Antes e depois do Morro da Oficina / Fotos: @maridcrocha

Invisibilização dos bairros

No dia da primeira tragédia, em 15 de fevereiro, além do Centro, foram muitos bairros atingidos simultaneamente por deslizamentos e alagamentos. “As fotos acabaram mostrando toda aquela situação para as pessoas que não estavam por perto ou não conheciam os bairros. Vemos o Centro da cidade voltando para uma vida mais normal, mas as pessoas nesses bairros ainda vivem com aquele cenário”, expôs.

Mariana frisou que é importante que todos registrem, publiquem, divulguem e denunciem o que acontece nas áreas mais marginalizadas da cidade. “Petrópolis tem esse status de Cidade Imperial, onde tudo parece lindo e perfeito, mas a maioria da população vive em áreas vulneráveis. É importante olhar para esses lugares com mais respeito e dar visibilidade para os problemas que acontecem lá”.

Com esse intuito de mostrar o outro lado da história é que Mariana começou a ir aos bairros e continua mostrando, até hoje, que pouco mudou desde seis meses atrás. “A própria história da cidade é de invisibilizar pessoas pobres, pretas e de periferia, botando-as em morros, nas áreas de risco”, afirma.

Vila Felipe no dia 12 de junho, quatro meses após as primeiras chuvas / Fotos: @maridcrocha

História e fotografia

Hoje, além de ser o Dia Mundial da Fotografia, é também o Dia do Historiador. Curiosamente, Mariana também é estudante de história. Para ela, essa formação impacta o seu olhar sobre o mundo e, consequentemente, sobre a imagem de suas fotos.

Antes de entrar para a faculdade, Mariana já se interessava por registrar a memória de pessoas e lugares, o que só foi se intensificando com o tempo.

Em 2019 iniciou um projeto intitulado “memória popular de Petrópolis”, que tinha como ideia, contar a história de bairros periféricos pelos olhares femininos daqueles locais. Chegaram a gravar mulheres em Vila Rica, e iriam para o Vale do Carangola e Siméria, porém, com a pandemia, o trabalho foi interrompido. Apesar disto, Mariana pretende retomar a iniciativa.

“Minha relação com a história influencia nessa vontade de recontar a história da cidade a partir dessas pessoas que vivem nos bairros. Muitas vezes, elas nem sequer têm acesso ao Centro. Precisamos valorizar as pessoas que realmente construíram e mantém a cidade, que são as que vivem nesses bairros. Na faculdade, me alimento de coisas que já vinha trabalhando na fotografia”, enfatizou.

Mobilização de trabalhadores e moradores no Morro da Oficina no dia 19 de fevereiro / Fotos: @maridcrocha

O poder da imagem

O mundo passa por um momento em que as imagens têm um significado muito grande. Muito disso vem pelo interesse da sociedade pelo audiovisual e pelo advento das redes sociais. “E cada vez mais elas vão ter um peso maior para a história. As pessoas são muito impactadas pelas imagens, é uma linguagem muito importante. É possível analisar uma foto e contar toda uma história através dela. É isso que as fotos da tragédia fizeram”, conta.

Morro da Oficina / Foto: @maridcrocha

Para Mariana, foi por meio das imagens que as pessoas entenderam e captaram o que estava acontecendo. “Não tenho o hábito de escrever texto nas minhas publicações das redes sociais porque acho que as fotos já dialogam e transmitem tudo o que eu quero contar”, finalizou.

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