6 iniciativas ambientais que podem evitar futuras tragédias em Petrópolis
Neste Dia Mundial do Meio Ambiente, especialista da UCP fala sobre maneiras de cuidar do espaço ocupado e soluções que podem ajudar a cidade a prevenir catástrofes
Petrópolis viveu a pior tragédia de sua história em fevereiro de 2022. Enchentes e deslizamentos provocaram a morte de centenas de pessoas, atingindo diversos bairros no primeiro distrito, incluindo o Centro Histórico. Em março, mais alagamentos, deslizamentos e mortes. Duas tragédias que somam pelo menos 241 vidas perdidas e outras duas pessoas que seguem desaparecidas.
Para especialistas, além da quantidade atípica de chuva que caiu nessas duas ocasiões, outros fatores também contribuíram para o que aconteceu na cidade.
Morro da Oficina, 2022/ Foto: @maridcrocha
Professor da Universidade Católica de Petrópolis (UCP), Engenheiro Civil, Sanitarista e do Meio Ambiente, Sérgio Aníbal cita alguns, como a ocupação desordenada do solo e o descarte irregular do lixo.
Neste Dia Mundial do Meio Ambiente, lembrado em 5 de junho, o especialista chama a atenção para que tanto sociedade civil quanto poder público estejam atentos em cuidar do meio ambiente para prevenir futuras tragédias.
Sérgio Aníbal/ Foto: Divulgação UCP
“Ainda que fosse uma única vida humana que tivesse sido perdida já seria muita coisa e nós perdemos muitas vidas humanas. A sociedade tem que estar atenta agora mais do que nunca ao que acontece à sua volta. Deve cobrar, mas também fazer a sua parte, procurando saber o que pode fazer. Será que meu limite está apenas em pagar impostos e ficar cobrando ou eu posso fazer mais alguma coisa? Certamente a sobrevivência de Petrópolis como cidade depende de um envolvimento de todos, no seu cuidado, na sua preservação. Hoje isso aqui é dramático, mas na verdade se estende para o planeta todo. Ou o homem se envolve nas questões e cuidados com o meio ambiente ou ele está plantando a sua própria destruição”, afirma.
Sérgio Aníbal diz que a ideia é deixar uma mensagem de esperança, mas que, para isso é preciso que cada indivíduo enxergue de fato o meio ambiente. “E observe com amor cada pormenor para que nós possamos deixar o planeta em boas condições para as futuras gerações”, completa.
Em entrevista ao professor, ele lista 6 iniciativas e soluções que podem ser tomadas pela sociedade e/ou poder público de curto, médio e longo prazo para que se evite outras tragédias em Petrópolis.
1- Cuidar do lixo
Para Sérgio, as atitudes preventivas começam na educação e conscientização da população que deve se considerar como parte ativa e não somente passiva no cuidado com o meio ambiente. Um dos primeiros passos que ele afirma que pode ser adotado pelas pessoas e que certamente vai ajudar muito a cidade e, consequentemente, o planeta, é o cuidado com o lixo.
“Cada um pode ter o hábito, tentar criar o hábito de separar o que pode ser encaminhado para reciclagem porque existem pessoas que trabalham com isso, inclusive em alguns bairros. Isso é um cuidado. Não lançar na rua um papel de bala, um copo plástico. Enxergar os resíduos como algo que pode ser recuperado e reutilizado de outra forma, pode ser reciclado. São muitos exemplos já nos nossos arredores do que pode ser reutilizado, minimizando a quantidade de resíduos que vai para os aterros sanitários”, afirma.
O especialista lembra que muitos países já lidam com descarte mínimo e essa já é uma forma de dar um respiro para o planeta onde os recursos são limitados. “Os aterros sanitários já estão ficando fora de moda. Precisamos tomar consciência daquilo que pode ser reaproveitado. É responsabilidade nossa, de cada um de nós, de nos preocuparmos com isso”, destaca.
Ele acrescenta que todos têm a ver com o que acontece ao redor. “E devemos considerar que nós temos possibilidade sim de fazer alguma coisa e, na verdade, temos muitas coisas que podem ser feitas e a primeira delas é justamente tomar consciência de que nós temos responsabilidade e que temos possibilidades. E não é só de cobrar, mas também de cobrar, mas de termos ações concretas de cuidado fraterno com o meio ambiente”, diz.
2 – Atenção à ocupação de encostas
A ocupação das encostas também deve ser uma área de atenção da população e do poder público em Petrópolis. Segundo o professor, ela precisa ser feita de forma harmoniosa com a natureza e seguindo a critérios técnicos.
Entre os riscos da ocupação irregular, ele comenta a questão de obstruir o caminho da água e o próprio acúmulo dela, somado a lixo e entulho, representa um fator de risco para o deslizamento de encostas.
“A ocupação precisa ser tecnicamente orientada para que a água seja sempre interceptada e conduzida de forma segura antes que ganhe velocidade, assim como os taludes devem estar numa inclinação compatível com a água que vai escoar por ali. E é o tipo de solo que vai indicar o tipo de corte que pode ser feito”, explica o especialista.
Para Sérgio Aníbal, o que aconteceu no Morro da Oficina, onde centenas de pessoas morreram em fevereiro, não é um acaso. Ele explica que é uma região que possuía quantidade muito grande de casas em cima de uma camada de solo que acabou encharcando demais.
“Nós temos que ter essa atenção em relação a ocupação do espaço e cuidados em todos seus aspectos. Cada espaço vai nos demandar um cuidado particular. Não deve existir uma regra única e geral para ocupação, mas devem existir orientações a serem seguidas e cada um terá sua própria medida dependendo das características locais”, diz.
3- Cuidado com os rios
Sérgio Aníbal aponta que os rios têm uma capacidade de escoamento e quando recebem mais água do que podem escoar, colocam para fora. Segundo o professor, há mais de 100 anos tanto Angelo Saturnino de Brito quanto Julio Frederico Koeler alertaram sobre a questão dos riscos da ocupação urbana no Centro Histórico, área de descanso dos rios, onde eles escoam em baixa velocidade.
“Então, existe a possibilidade de conviver com as chuvas e que o Centro seja preservado, as ruas sejam preservadas de cheias, mas há necessidade de que se tome providências com relação a água que sobra hoje em dia. Porque não cabe toda a água no canal dos rios. E se [a água do rio] está ocupando a rua é evidente que ele está dizendo que esse espaço é dele. Se a gente tem a Coronel Veiga enchendo, alguma coisa o rio está querendo nos dizer. Vamos ter que compensar ao rio esse espaço que lhe retiramos para fazer as ruas”, acredita Sérgio.
Para ele, é considerável dizer que determinados tipos de chuva poderiam fazer os estragos como os de fevereiro, mas que isso ocorreria a cada 30, 50 anos. “Nós teríamos a cheia da Coronel Veiga, da Piabanha, mas não teríamos cheias todos os anos. Isso a natureza não faz. Se está fazendo isso é porque nós ocupamos de maneira irresponsável”, afirma o professor.
Com relação às obras nos rios, ele afirma que devem ser não só de limpeza, mas de adequado dimensionamento do sistema, de drenagem e de amortecimento. “Temos na UCP vários projetos, TCCs relativos a esse assunto. É possível resolver tecnicamente, com esforço, mas há possibilidade e todos devem ter consciência de que é possível [resolver a questão das enchentes em Petrópolis]”.
4- Criação de cisternas
Já discutida em sala de aula na Universidade como possível medida para minimizar a quantidade de água que escoa para os rios, está a construção de cisternas. A ideia, segundo Sérgo Aníbal, seria segurar a água de precipitações mais intensas, evitando que naquele momento crítico ela vá para as ruas e, consequentemente, para os rios.
“E depois vai administrando essa água, soltando aos poucos, bombeando ou reaproveitando. E isso pode ser motivado. O poder público pode distribuir projetos de cisternas para que as pessoas implementem nas suas casas, criar algum tipo de incentivo fiscal para que isso ocorra. E nós temos estudos na Universidade que mostram claramente que é possível deter na casas boa parte das águas que vão para os rios e nossas áreas públicas, lojas, toda as edificações que ficam dentro do raio da mancha de inundação”, sugere.
O especialista reforça que os volumes das águas tanto de fevereiro quanto de março foram atípicos, mas lembra também que o planeta está passando por transformações climáticas decorrentes da deterioração do meio ambiente e de outros fenômenos que não são tão raros como La Ninã e El Niño, mas que, segundo ele, sozinhos não teriam a capacidade de fazer tanto estrago.
“O estrago é justamente o descuido na hora de fazer as nossas edificações, de permitir de forma desordenada a ocupação e de não tomar o cuidado com a questão da percolação do solo. Nós temos que reduzir essa questão da quantidade de água que vai para os rios”.
5- Sensibilização da sociedade
Entre as iniciativas que podem ser tomadas pelo governo municipal, Sérgio Aníbal cita o fato de o poder público ter a possibilidade de sensibilizar a sociedade para questões urgentes no que diz respeito ao meio ambiente.
“O poder público tem a possibilidade de ser não só aquele que toma a iniciativa, mas aquele que anima o povo a se unir nas lutas que dependem hoje de todos. Tem muita coisa que a população pode fazer motivada, instruída, educada, incentivada pelo poder público, que tem essa capacidade de levar a boa informação e as boas determinações”, destaca.
Sérgio lembra ainda que todos fazem parte do meio ambiente. “E tudo que ocorre nele ora nos atinge diretamente ora indiretamente. E nós estamos pagando as consequências, nos tornamos vítimas daquilo que nós provocamos, não intencionalmente, mas por desconhecimento provavelmente. Ninguém quer plantar uma tragédia para si, mas pode acabar plantando se não faz com os critérios e cuidados que a boa técnica demanda”.
6- Devolver a natureza o que é dela
Com a devastação de diversas áreas pela cidade, Sérgio Aníbal acredita que seria de bom grado devolver à natureza o que é dela e que ela mesma ocupou nas tragédias.
“Nós hoje temos áreas que não devem ser mais habitadas. Em alguns lugares de tragédia, deve-se plantar uma grama amendoim, um revestimento leve, e tomar cuidado com as águas, interceptá-las. Já que a natureza arrancou casas e áreas inteiras que estavam ocupadas, devemos devolver aquele espaço para ela”, conclui.