A história por trás da foto: os desafios e as amizades dos antigos circuitos automobilísticos de rua
Quem se lembra ou ouviu falar dos icônicos pilotos Aylton Varanda e Mário Olivetti?
Paixão que ultrapassa limites, o automobilismo desafia conceitos, expectativas e, em seus primórdios, se revelava um verdadeiro ato de coragem. Na segunda edição da série de reportagens A história por trás da foto, relembre os tempos dos circuitos automobilísticos de rua em Petrópolis a partir de relatos e lembranças que envolvem os lendários Aylton Varanda e Mário Olivetti: corredores que, além dos contratempos, enxergaram propósito.
Foto: Arquivo pessoal José Augusto Varanda
As dificuldades não eram poucas e, ainda assim, a sensação de estar ao volante era capaz de fazê-los mover montanhas para vivê-la novamente. Nascido em Bicas – Juiz de Fora, mas desde bem jovem morador de Petrópolis, foi na oficina mantida por seu pai, o empreendedor e comerciante José Varanda, que Aylton conheceu e se apaixonou pelo universo dos automóveis.
Em um primeiro momento eleito o “motorista da família” nas viagens do grupo ao interior, Aylton passou a praticar suas habilidades na cerração da Serra Rio – Petrópolis para, mais tarde, protagonizar as provas em alta velocidade pelas ruas do Centro da cidade. Contra a vontade dos familiares, que temiam o perigo do evento, ele participou do Circuito de Petrópolis pela primeira vez em 1951.
Filho de Aylton, José Augusto Varanda, de 68 anos, relembra o papel exercido pelo pai num período em que, além de assumirem os volantes, os pilotos participavam da organização das corridas, preparação dos carros e trabalhos mecânicos de última hora. Frente à falta de apoio, patrocínio e equipe, o condutor corria na pista e fora dela para viabilizar os torneios e a breve sensação de liberdade proporcionada por eles.
Foto: Arquivo pessoal José Augusto Varanda
“Era, realmente, um empenho muito grande da parte dele porque não havia apoio nenhum – financeiro ou emocional. Muitas vezes os últimos ajustes se estendiam até a madrugada do dia da prova e, depois disso, os pilotos ainda conduziam os próprios carros até o local da competição”, recorda José Augusto. A partir dos 10 anos de idade, ele passou a acompanhar o pai nas provas: sinônimo de alegres lembranças nos boxes e muitas histórias.
Foto: Arquivo pessoal José Augusto Varanda
“Me lembro de dormir muito nos pneus lá em Interlagos e até hoje meus amigos de Petrópolis têm ótimas recordações dessa época. Eles adoravam ir comigo onde os carros estavam sendo preparados para as provas”. Na teoria pautados pela competitividade, na realidade os circuitos se revelavam resultado da união dos participantes em fazer as provas acontecerem para que, juntos, desfrutassem de momentos de êxtase.
Foto: Arquivo pessoal José Augusto Varanda
Em fotografia datada de 1961, aparecem posando junto a um carro Aylton Varanda e seu parceiro Mário Olivetti – este acompanhado dos filhos. Embora não na imagem, José Augusto, entusiasta do automobilismo e um dos grandes admiradores da caminhada de seu pai, dá detalhes sobre o que se passava naquele momento. No registro, figura um protótipo construído pela dupla: o chamado “Tanto Faz”, já que “não se sabia se ele estava indo ou voltando”.
Foto: Arquivo pessoal José Augusto Varanda
“Eles resolveram, a partir de um JK acidentado, construir um protótipo que fosse um pouco mais leve e competitivo nas pistas. Quem executou foi o Renato Peixoto, o Peixotinho. A construção era bem artesanal e essa foto foi tirada logo que ficou pronto, antes deles saírem para a corrida. Os dois tiveram êxito e conquistaram o terceiro lugar no Mil Milhas, prova disputada até hoje. Conseguiram essa façanha”, relata José Augusto.
Esporte trilhado e conquistado em conjunto, a história do automobilismo, já naquela época, era escrita a múltiplas mãos – nos bastidores e na pista. No caso de Aylton, dividiram as pistas com ele seus primos Álvaro e João Varanda Filho, o Jiquica; além dos pilotos Victor Levy, o amigo Mário Olivetti e Sérgio Cardoso – este último falecido na última edição do Circuito de Petrópolis, em 1968.
“Ele já tinha tomado a decisão de parar em 67. Depois do falecimento do Sérgio ele se afastou um pouco, mas sempre se mantendo envolvido no automobilismo, ajudando na preparação de equipes. Meu pai era muito ativo. Sempre acelerado”. Apaixonado pela sensação de desafiar a si mesmo, Aylton, como outros pilotos de sua época, deixou como legado a importância de ir contra expectativas e se manter fiel a seus princípios para redefinir conceitos.
Foto: Arquivo pessoal José Augusto Varanda
“Meu pai conseguiu escrever o nome dele na história e mostrou o valor que existe em lutar por seus ideais. Eu não tinha ambição de ser piloto porque eu via as aflições do meu pai e a forma como as provas afetavam a família, mas eu queria ser engenheiro mecânico nessa área”. Graduado em Engenharia Mecânica, mas sem ter nela atuado, José Augusto conduz, ainda assim, uma vida em que o automobilismo se faz presente em todos os momentos.
Seja nas temporadas de Stock Car e Fórmula 1 que acompanha religiosamente; na transmissão da paixão ao desporto aos filhos e netos; ou então à preservação da história do pai, José Augusto conserva fotografias, trajes, troféus, lembranças e aprendizados que mantém vivos os sacrifícios de quem, além dos contratempos, enxergou propósito e classificou como maior perigo o ato de abrir mão dos próprios princípios.
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