Entrevista: pesquisadores do LNCC, em Petrópolis, tiram dúvidas sobre o novo coronavírus
No dia 21 de março pesquisadores do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), em Petrópolis, fizeram o sequenciamento de 19 genomas do novo coronavírus em tempo recorde (48 horas), contribuindo significamento com a vigilância genômica viral em todo o país.
Após conhecer mais a fundo a estrutura genética do vírus causador da Covid-19, a equipe do Laboratório de Bioinformática do LNCC, coordenada pela geneticista Ana Tereza Vasconcelos, respondeu as principais dúvidas da população sobre o coronavírus em uma entrevista à Sou Petrópolis. Confira!
Foto Divulgação / LNCC
Sou Petrópolis: Qual é a melhor forma de diminuir a contaminação do coronavírus, segundo a última pesquisa que vocês fizeram no LNCC?
Pesquisadores do LNCC: A pesquisa desenvolvida no LNCC mostrou, dentre outras coisas, a presença de transmissão comunitária ocorrendo no país, isto é, pessoas infectadas que não estiveram em nenhum outro país com registros da doença. Diante deste cenário, a melhor forma de diminuir a contaminação é através de isolamento social. Por se tratar de um novo vírus sem a disponibilidade de um tratamento específico, medidas gerais como essa são nossa melhor oportunidade.
Sou Petrópolis: As temperaturas mais altas no Brasil são um fator que diminui a resistência do vírus?
Pesquisadores do LNCC: Muito se especula sobre a influência da temperatura na transmissão viral. Alguns artigos descrevem que existe uma possibilidade de climas frios serem mais favoráveis para propagação viral. Sabe-se que esses vírus se disseminam pelo ar em partículas invisíveis. Porém, mais estudos precisam ser realizados neste campo. O que pode parecer uma vantagem para o Brasil, pode também ser visto por um outro lado. Altas temperaturas favorecem a propagação de outros vírus como dengue, zika e febre amarela, desta forma, poderíamos correr o risco de ter uma taxa de coocorrência de infecções maiores do que nos países com baixa temperatura.
Sou Petrópolis: Por que os efeitos da contaminação pelo coronavírus podem ser tão diferentes de uma pessoa para outra?
Pesquisadores do LNCC: Existem, até o momento, três possíveis explicações pra isso. A primeira é que manifestações mais severas da COVID-19 estão, geralmente, associadas à presença de doenças secundárias nos pacientes. Geralmente, pessoas que possuem hipertensão, diabetes e doenças cardiovasculares, têm um risco aumentado de desenvolverem os sintomas mais graves.
Em segundo lugar, diferentes tipos do novo coronavírus circulam ao redor do mundo. A medida que o vírus se replica, ele sofre mutações que o torna um pouco diferente dos demais. Estudos apontam que essas diferenças podem estar associadas com as formas leves e mais graves da doença. Vírus com determinadas mutações podem levar a quadros clínicos mais severos.
Por último, a outra explicação que tem sido discutida na comunidade científica são as diferentes constituintes genéticas de cada indivíduo. Chineses possuem marcas genéticas diferente de europeus e americanos, desta forma, é possível que haja uma influência genética associada às diferentes manifestações da doença.
Sou Petrópolis: Por que existem pessoas assintomáticas ao novo coronavírus?
Pesquisadores do LNCC: A existência de pessoas assintomáticas pode estar diretamente associada ao estado de saúde das pessoas infectadas e ao perfil genético de cada indivíduo. Ainda, a ausência de comorbidades tem sido levantada como um dos principais fatores desta ocorrência.
Vale ressaltar que apesar de ser um vírus novo, é possível que existam pessoas com anticorpos contra o novo coronavírus antes mesmo de terem sido infectadas. A produção de anticorpos é um processo que acontece de forma aleatória e independente de um agente infeccioso, ou seja, nossas células estão constantemente produzindo anticorpos que são capazes de reconhecer invasores de qualquer tipo. Após a entrada de algo não próprio do corpo, nosso sistema imune busca o repertório de anticorpos já existentes para tentar combater ou, com auxílio das células do sistema imunológico, faz a identificação dessa molécula não própria e inicia a produção de novos anticorpos que sejam específicos para o invasor estranho.
Sou Petrópolis: Por que o vírus costuma ser mais letal em pessoas mais velhas?
Pesquisadores do LNCC: Geralmente idosos têm uma resposta imunológica reduzida e, por vezes, comprometida. Além disso, doenças e comorbidades associadas ao envelhecimento podem ser as principais explicações.
Sou Petrópolis: Qual a diferença genética entre o coronavírus o vírus da gripe?
Pesquisadores do LNCC: Existem grandes diferenças genética e moleculares entre o vírus da gripe e o novo coronavírus. Essas diferenças refletem em diferentes efeitos e modos de infecção, bem como diferentes classificações de famílias virais. Ou seja, o vírus da gripe pertence a uma família diferente do novo coronavírus e tem modos alternativos de entrar nas células humanas.
Sou Petrópolis: Todas as pessoas, que puderem, deveriam ficar em isolamento social, independente da idade?
Pesquisadores do LNCC: Com certeza! O isolamento social é mais do que necessário e cientificamente comprovado como eficaz.
Sou Petrópolis: Luvas e máscaras nos protegem da transmissão da doença?
Pesquisadores do LNCC: As máscaras são eficazes na diminuição dos casos transmissão da doença. As luvas podem auxiliar na diminuição da contaminação, porém não é recomendada para a população comum. Se forem utilizados de forma incorreta, esses equipamentos de proteção individual mais atrapalharão do que ajudarão. É importante manter um hábito de higienização constante e seguir as normas dos órgãos de saúde. Estamos entrando em uma fase crítica da transmissão da doença no Brasil, assim, é muito importante ficar atento.
Sou Petrópolis: É verdade que se pegarmos coronavírus uma vez, depois não pegamos mais?
Pesquisadores do LNCC: Ainda não há evidências científicas suficientes para afirmar isso. Apesar de poucos, já existem publicações de pessoas reinfectadas pelo vírus. Precisamos realizar mais estudos para tal. Contudo, tendo em vista outras viroses emergentes, é possível que haja casos de reinfecção.
Sou Petrópolis: O vírus que se espalhou na Europa e na China é o mesmo que está aqui no Brasil? Ou ele pode ter sofrido algum tipo de mutação?
Pesquisadores do LNCC: Nossos resultados mostraram que dos 19 genomas virais sequenciados no LNCC, a maioria era oriundo da Europa e alguns poucos da China. A medida que o vírus se replica e se instala em um novo território ele pode sofrer diferentes mutações e consequentemente se tornar diferente dos demais lugares de origem.
Sou Petrópolis: Se vocês pudessem dar um recado para todos os petropolitanos que não estão levando essa pandemia a sério e continuam desrespeitando a quarentena, sem necessidade, o que diriam?
Pesquisadores do LNCC: Para aqueles que não acreditam, diríamos para que antes de qualquer coisa tomem conhecimento do que está acontecendo no resto do mundo. Países europeus desenvolvidos, EUA, todos estão sofrendo fortes consequência do coronavírus. Tentar trazer para realidade do Brasil o que está acontecendo lá fora, sem dúvidas, nos colocaria em uma posição muito pior que a deles. Desta forma, é necessário manter o isolamento social, bem como todas as instruções dos órgãos de saúde pública, se não por si próprio, pelo menos pelas pessoas que amamos e convivemos que fazem parte do grupo de risco.
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