Petrópolis foi eleita a cidade mais segura do Rio, mas as mulheres também estão seguras?
Ranking anuário das ‘Cidades Mais Seguras do Brasil’ reconhece o município por seu baixo índice de homicídios. Mas quando se fala de violência de gênero, a cidade ocupa posição oposta
Apesar de Petrópolis ter sido apontada como a cidade mais segura do estado do Rio de Janeiro em 2024, quando considerada a taxa de homicídios entre municípios com mais de 100 mil habitantes, os dados não refletem, necessariamente, a realidade de todas a população— especialmente a das mulheres.

Foto: Ilustrativa
Segundo dados do Dossiê Mulher 2025, do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP-RJ), Petrópolis registrou 3.127 casos de violência doméstica e familiar contra mulheres em 2024 — o maior número absoluto entre as cidades fluminenses analisadas. Os registros incluem diferentes tipos de agressão:
- 36% violência psicológica
Ocorre quando o agressor intimida, constrange, manipula, persegue, explora, inferioriza e faz a vítima se sentir “louca”.
- 27% violência moral
ocorre quando a vítima é xingada, submetida à calúnia, difamação, injúria ou exposta de forma depreciativa.
- 26% violência física
Ocorre quando o agressor usa intencionalmente a força física para ferir, lesionar ou causar dor, resultando em danos à integridade corporal da vítima.
- 6% violência sexual
Ocorre quando o agressor submete a vítima a atos sexuais contra sua vontade, além da concepção tradicional de estupro, que muitas vezes é associada à violência em uma rua escura com um desconhecido. A opressão sexual pode se manifestar em diversas formas, como forçar a mulher a realizar atos que ela não deseja, retirar o preservativo durante a relação sem consentimento, obrigá-la a praticar modalidades de sexo indesejadas, utilizar o argumento de que é seu “dever” como esposa para forçar relações, impedir que ela use contraceptivos, entre outras atitudes coercitivas.
- 5% violência patrimonial
Quando o parceiro quebra objetos de trabalho, bens, roupas, documentos ou o celular, que é, além de um bem, a possibilidade de pedir ajuda para a família, amigos ou polícia.
*Os índices, segundo o levantamento, não representam a totalidade dos casos, já que a subnotificação é um fenômeno frequente em crimes contra mulheres.

Foto: Divulgação
Início de uma relação perfeita
O relacionamento de Fabiana, com o ex-namorado, teve início por meio das redes sociais.
“Eu morava em Minas Gerais e ele em Petrópolis. Estava solteira há um tempo e descrente do amor. Nessa era digital, resolvi me arriscar. Ele era superatencioso e gentil. Trocamos contato e, desde então, nos apaixonamos — ou pelo menos era o que eu pensava. Como eu morava com minha mãe e ele morava sozinho, no nosso primeiro encontro eu vim para a cidade. Saímos várias vezes até que, com um mês, fui pedida em namoro. Depois de alguns meses, resolvi me mudar e morar com ele. Eu estava muito feliz”, relata.
Sinais de um relacionamento tóxico
Os primeiros sinais apareceram quando a comunicação já não era mais a mesma do início do relacionamento. Segundo Fabiana, tudo parecia uma “superproteção” que ele tentava demonstrar quando pediu para que ela deixasse o trabalho e começou a restringir suas saídas com as amigas que havia feito na cidade, além de limitar até mesmo os encontros com familiares.
“Ele pedia para ver meu celular quando eu chegava do trabalho, perguntava com quem eu tinha conversado durante o dia. Até então, eu achava normal. Teve um dia em que ele disse que achava melhor eu parar de trabalhar e passou a me buscar todos os dias no serviço. Sempre trabalhei, e não achava confortável depender do sustento dele. E ele foi colocando outras questões que não faziam sentido: como eu não poder visitar minha mãe, reclamar das minhas roupas, do tempo que eu ficava no celular”, relata.
Agressões psicológicas e físicas
Fabiana detalha que as falas ditas por ele a faziam acreditar que suas atitudes estavam erradas. “Por várias vezes me senti culpada pelo nosso relacionamento não estar indo bem. Ele fazia de tudo para que eu me sentisse ‘um lixo’. Chorava, dizendo que só brigava comigo porque me amava e que eu não facilitava as coisas.”
Foi durante uma viagem que aconteceu a primeira agressão física. “Foi por causa de uma roupa. Ele disse que eu não estava vestida de forma adequada para irmos jantar e, do nada, veio a agressão. Em seguida, o arrependimento, me colocando como a errada da história”, lembra.
Busca por ajuda
Foram várias situações até Fabiana notar que precisava de ajuda para sair do relacionamento.
“Percebi que estava sozinha, só eu e ele… e que, em algum momento, eu não existiria mais. Já tinha perdido minha personalidade, meus amigos e meus familiares. Já sabia que estava em um relacionamento abusivo e que precisava sair daquela situação. Após mais uma agressão física, pedi ajuda a uma amiga, que me acolheu em sua casa, em outra cidade. Saí da casa dele apenas com a roupa do corpo. Fui ameaçada. Com a ajuda dessa amiga, fui à delegacia e denunciei — e essa foi a melhor decisão que tomei. Caso contrário, não sei dizer como estaria minha vida hoje. É muito difícil sair de um relacionamento abusivo, mas não podemos virar estatística. É preciso buscar força, pedir ajuda e seguir em frente”, conclui Fabiana.
Segurança para quem?
Uma cidade só pode ser considerada verdadeiramente segura quando todas as pessoas se sentem protegidas — especialmente grupos mais vulneráveis. A disparidade entre a baixa taxa de homicídios e os altos números de violência doméstica em Petrópolis revela que a sensação de segurança não é homogênea entre a população.
Enquanto o município ganha notoriedade por indicadores positivos de criminalidade geral, mulheres seguem expostas a situações de risco dentro e fora de casa.

Foto: arquivo
Onde pedir ajuda?
Em Petrópolis, o Centro de Referência em Atendimento à Mulher (CRAM), funciona na Rua Santos Dumont, número 100, em anexo ao Centro de Saúde Coletiva.
Outro espaço que cuida de mulheres em situação de violência é a Sala Lilás, do Hospital Alcides Carneiro (HAC).

Foto: divulgação
Outros canais de atendimento:
Polícia Militar – (24) 2291-4020
WhatsApp do CRAM – (24) 98839-7387
Centro de Referência em Atendimento à Mulher – (24) 2243-6152
Patrulha Maria da Penha – (24) 99229-2439
Sala Lilás – (24) 2246-8452
105ª DP – (24) 2291-0816/(24) 2291-0877
106ª DP – (24) 2222-7094/ (24) 2232-0135
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