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[Entrevista] Conheça a talentosa quadrinista petropolitana que já acumula 100 mil seguidores nas redes sociais

Cultura

[Entrevista] Conheça a talentosa quadrinista petropolitana que já acumula 100 mil seguidores nas redes sociais

Clara Gomes é a artista por trás das tirinhas dos “Bichinhos de Jardim”, publicadas no jornal “O Globo” há mais de uma década

Você provavelmente já viu alguma tirinha dos “Bichinhos de Jardim” em jornais, livros ou na Internet, mas nem imagina que a desenhista por trás delas é petropolitana. Clara Gomes, de 43 anos, é quadrinista no jornal “O Globo”, tem artes publicadas em diversos livros e já acumula mais de 100 mil seguidores somados nas redes sociais.

Clara Gomes e seu livro mais recente. Fotos: Arquivo Pessoal

Nascida em Petrópolis, a artista é formada pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e morou por 15 anos na capital. Em 2021, voltou para a Cidade Imperial, onde vive atualmente.

Suas tirinhas curtas e bem-humoradas falam sobre situações cotidianas, utilizando insetos cheios de personalidade. Confira nossa entrevista com a criadora dos “Bichinhos de Jardim” para conhecer mais sobre ela e seus personagens:

Primeiro, pode me contar um pouco de onde vem esse seu interesse pelas histórias em quadrinhos. E quando isso se tornou uma profissão pra você, quando sua carreira de fato começou?

CG: O amor pelos quadrinhos vem da infância. Adorava revistas da Turma da Mônica, tanto pela estética, que me interessava mais do que as revistas estrangeiras disponíveis na época, como pelos enredos, que falavam muito ao coração de uma pequena leitora brasileira como eu – e tantas outras crianças. A gente pegou gosto pela leitura nos divertindo com essa turma.

Comecei a desenhar para jornal muito cedo – outra paixão, para além das revistas da Mônica, eram as tirinhas de jornal. Tive a oportunidade de dar vida a meus primeiros personagens nas páginas da Tribuna de Petrópolis, dentro do caderno infantil Tribuninha. Eu tinha 14 anos, comecei a convite do editor Fernando Marques, após um concurso de desenho, e passei a colaborar com a edição de domingo do jornal. Ali foi minha escola, eu ainda estava no fundamental, não tinha essa percepção de carreira, embora já entendesse aquilo como um trabalho. Mais tarde entrei na Escola de Belas Artes da UFRJ e me profissionalizei como designer.

Primeira tira dos Bichinhos na Tribuninha e seu livro mais recente. Fotos: Arquivo Pessoal

Quando você começou, já era com os Bichinhos de Jardim ou com outros personagens? Atualmente, você também desenha e escreve sobre outros personagens?

CG: Tinha dois personagens, o Jujubinha e o Reco-Reco. As historinhas eram muito pueris e simplórias. Os Bichinhos de Jardim vieram um pouco depois, por volta do ano de 99/2000 e, aos poucos, o traço foi evoluindo, os temas e humor foram se sofisticando e acho que o trabalho amadureceu junto comigo.

Também atuei muitos anos ilustrando livros didáticos e criando peças de identidade visual, entre outros trabalhos na área de design gráfico. Nos quadrinhos, recentemente desenvolvi uma série de personagens e tirinhas para o endomarketing do banco Itaú.

De onde veio a ideia de criar os personagens de Bichinhos de Jardim? Como você consegue explorar tão bem esses personagens?

CG: Tenho encantamento por micro-universos desde sempre: meu avô, Perminio Gomes, foi um conhecido miniaturista na cidade de Petrópolis e eu gostava muito de ver os trens, casinhas e as pequenas peças que ele construía com tanto esmero. A observação de pequenos bichinhos também me inspirava – um dia, passei a imaginar uma sociedade deles que fosse parecida com a nossa. Na época, tive as referências de dois desenhos animados com essa temática, Bug’s Life e FomiguinhaZ. Daí comecei a criar meu próprio repertório de personagens e narrativas.

Clara Gomes na CCXP de São Paulo em 2023. Fotos: Arquivo Pessoal

De onde vem a inspiração para as suas tirinhas? Qual o tema que o seu público mais gosta de ler e quais temáticas você mais gosta de escrever?

CG: A inspiração nasce de um conjunto de fatores, acho que vem da observação curiosa, das vivências e da leitura constante da realidade. Não é fácil explicar, mas depende da vontade de mergulhar no mundo e nas relações humanas.

Gosto de escrever sobre o assunto que capturar meu interesse no momento: pode ser inteligência artificial, autoconhecimento, novela, escritório… O público curte muito as tiras sobre cotidiano – quando falo sobre cafezinho, por exemplo, tenho sempre muitas respostas positivas. Os leitores, principalmente de redes sociais, querem proximidade.

Qual você acredita ser o diferencial das suas tirinhas?

CG: Nunca pensei em diferencial, mas em ser fiel a mim mesma e respeitar os leitores que me acompanham. Tenho a filosofia do Caramelo, o caracol: “devagar e sempre”. Não acredito que exista fórmula para originalidade, mas quando a gente trabalha com verdade, acaba por atrair um público genuíno. Não sou viralizada, mas tenho muita gente que me acompanha desde 2008, 2009. Isso é valiosíssimo.

Clara Gomes e o editor da Maurício de Souza Produções (MSP), Sidney Gusman, na CCXP de São Paulo em 2023. Fotos: Arquivo Pessoal

Como surgiu o convite para publicar as suas tirinhas no O Globo? Você continua lá desde 2010, certo? Como você se sente sendo publicada por um jornal tão grande?

CG: Sim, entrei no jornal O Globo em 2010, por indicação de um cartunista amigo, André Dahmer. Ele soube que a editora estava buscando mais cartunistas mulheres para o Segundo Caderno e me chamaram. Continuo sendo o único olhar feminino no reduzido espaço de tirinhas do jornal.

É surreal quando penso que meu sonho de infância se realizou, que era ocupar esse espaço. Ao mesmo tempo, estamos testemunhando o lento velório das mídias impressas, e sinto cada vez menos impacto quando conto a alguém que publico em um jornal “de papel”.

Outra grande conquista sua foi ter feito parte da MSP+50, do Maurício de Souza. Como você se sentiu por fazer parte de um projeto de um dos maiores quadrinistas do Brasil?

CG: Foi emocionante ser selecionada para essa publicação e figurar entre tantos desenhistas incríveis. Agradeço essa participação ao editor Sidney Gusman, que é uma das pessoas mais queridas do universo MSP. Como falei no início, Mauricio sempre foi uma referência – posso dizer que realizei outro sonho de infância ou estou sendo repetitiva?

Publicação de Clara na MSP+50. Foto: Arquivo Pessoal

Além destes, quais você considera serem os maiores feitos da sua carreira?

CG: Tenho muita satisfação em ter sido convidada para grandes eventos, como palestrante ou expositora (Campus Party, Salão Internacional do Humor Gráfico, em Recife, Exposição HQBR21, em SP, Banca de Quadrinhos do Itaú Cultural, também em SP), além de integrar a coletânea fotográfica de Paulo Vitale, o “Livro Cartunistas”, que reúne retratos de artistas gráficos influentes – como Mauricio de Sousa, Laerte, Jaguar e Angeli. E, em 2015 fui convidada do programa da Globo Encontro com Fátima Bernardes, onde desenhei ao vivo e mostrei meus desenhos.

Isso aí é currículo, mas minha maior realização como cartunista foi uma vez em que encontrei o Ziraldo, por acaso, e ele disse que adorava meus quadrinhos, disse que eu era “genial e debochada”. Acho que nada pode superar isso!

Clara no Programa Encontro com Fátima Bernardes e com Ziraldo, criador do Menino Maluquinho. Fotos: Arquivo Pessoal

Você já publicou livros autorais, certo? Quais são eles? E além destes, em quais outros livros os seus personagens foram publicados?

CG: Tenho dois livros publicados, o primeiro foi por um selo da Ediouro, em 2009 e o mais recente em 2023, de forma independente, com apoio dos leitores e amigos. Além disso, minhas tirinhas são publicadas em obras de material didático, ilustrando conteúdos pedagógicos, em milhares de publicações em todo o país.

E agora falando mais sobre o mercado dos quadrinhos, antigamente eram comuns as publicações tradicionais, de materiais impressos, além das tirinhas de jornal, como é o seu caso. Hoje, apesar de existirem diversas formas de autopublicação ou divulgação da sua arte, como perfis em redes sociais ou sites, ainda é difícil monetizar esse conteúdo. Que dica você dá pra quem quer seguir profissionalmente no ramo das histórias em quadrinhos?

CG: Pois é, já estou há tempos na área e acompanhei as muitas transformações, tanto na forma de se consumir entretenimento e cultura quanto nas tecnologias de produção e divulgação. Algumas coisas já estão bem definidas: minha profissão, cartunista de jornal, está com os dias contados.

Acredito que, o mais difícil para iniciantes, nos dias de hoje, é encarar a internet já entupida de conteúdo. Se eu pudesse dar alguma dica, seria: saia das redes sociais, leia bastante, estude e pratique sem a pressão da instantaneidade e da comparação. Desenhar e criar leva tempo. E lembre-se: o essencial não é a ferramenta (se desenha com caneta, ou no computador, ou software que usa), mas sim encontrar o seu próprio caminho para contar histórias relevantes e sensíveis, que se conectem ao coração de quem vai ler seu trabalho.

Em relação à parte mercadológica, é interessante estudar bastante sobre as plataformas de divulgação e de financiamento coletivo, além de construir uma rede de contatos, amigos, colegas, família – para ajudar a impulsionar seus projetos.

Jogo Amazônia para Petrobrás e os personagens do Bichinhos de Jardim. Fotos: Arquivo Pessoal

E pra finalizar, qual a importância das histórias em quadrinho na sua vida e qual você acredita ser a importância para a sociedade em geral?

CG: Os quadrinhos foram uma forma de arte acessível para mim, para além da televisão, na infância. Devo a eles grande parte de meu interesse pela leitura e escrita. Acho que a importância das histórias em quadrinhos para a formação de leitores está mais do que comprovada e sinto isso sempre que vou ministrar alguma oficina em escolas, a receptividade de professores e alunos é sempre muito bacana.

Porém, os quadrinhos vão bem além do infantil: também conhecidas como romances gráficos, as histórias em quadrinhos apresentam narrativas através de uma estrutura própria, aproximando-se do cinema, tanto pelos enquadramentos visuais como pela estrutura de sequência temporal.

Existem quadrinhos sobre inúmeras temáticas e, aqui no Brasil, temos autores excelentes. Dentre as obras que me interessaram recentemente, cito aqui Os Santos (de Leandro Assis e Triscila Oliveira), que fala sobre racismo, as publicações do Pablito Aguiar, que misturam quadrinhos, reportagem e crônica; temos a Lark, que lançou O Livro dos Pássaros, que fala com humor sobre relações de trabalho, Helô D’Angelo que lançou um livro sensacional escrito na época da pandemia, o Isolamento. São trabalhos interessantíssimos – e só citei alguns!

Autográfico de Maurício de Souza para Clara na MSP+50. Foto: Arquivo Pessoal

O trabalho de Clara pode ser acompanhado pela página do Facebook Bichinhos de Jardim e pelo Instagram @bichinhosdejardim.

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