Com diagnóstico de ‘alcoolista funcional’, petropolitana compartilha trajetória até completar 60 dias sem beber
Daniela Brum tem 28 anos, dois filhos e revela ter enfrentado dificuldades para admitir que exagerava no consumo do álcool
Daniela Moraes Brum tem 28 anos e é petropolitana. Mãe do Benício e do Caetano, militante, produtora de conteúdo e autora do livro “Feminismo pra quem?”, Dani Brum, como é conhecida nas redes sociais, se deu conta há poucos meses de que tinha um problema com o consumo exagerado de álcool. Ao admitir que precisava parar e buscar ajuda especializada, recebeu o diagnóstico de ‘alcoolista funcional’.
Dados da Organização Mundial mostram que no mundo, 26,5% dos jovens de 15 a 19 anos consumiram bebida alcoólica no último ano, correspondendo a cerca de 155 milhões de pessoas. As taxas de consumo atual mais altas nessa faixa etária foram observadas na região Europeia (43,8%), seguida das Américas (38,2%).
Foto: Arquivo pessoal
O contato com a bebida, segundo Daniela, começou na adolescência, em sociais e festas com os amigos. Depois de 12 anos bebendo “socialmente”, ela percebeu que a relação com o álcool – geralmente cerveja e, raramente, vinho – não estava normal.
Em entrevista à Sou Petrópolis, a produtora de conteúdo relata como identificou os primeiros sintomas, os motivos pelos quais resistiu ao fato de que tinha um problema, a relação entre a bebida e a maternidade e como tem sido a experiência depois de ter começado o tratamento.
“Alguns amigos já tinham relatado que eu tinha dificuldade de parar de beber depois que começava, e eu passei a perceber isso. Comecei a fazer acordos “mentais”, saía e pensava: “Hoje eu vou beber apenas duas cervejas”. Nunca deu certo. Até que eu comecei a reparar que qualquer momento em que eu estava socializando com amigos, eu queria envolver a cerveja, momentos que não precisava dela, eu queria beber”, conta.
Daniela, então diz que começou a refletir sobre o quanto mudava com o álcool e como bebia muito mais que outras pessoas. Ela conta que enquanto em uma conversa de bar, os amigos tomavam um copo, ela já tinha tomado quatro e que absolutamente tudo se tornava razão para beber uma cerveja.
A abstinência
Quando não bebia, a produtora de conteúdo diz que tinha mudanças bruscas de humor, dores de cabeça muito fortes, além da ansiedade pela cerveja. Ao conversar com a médica que a acompanha, recebeu a informação de que isso era abstinência.
“Nos fins de semana e sempre que eu bebia mais, acabava não me alimentando. Isso começou a afetar meu casamento, pois eu saía e acabava voltando muito tarde. E todas as vezes que bebia, acordava com um arrependimento diferente. Além disso, eu passei a ter problemas para socializar sem o álcool, não conseguia mais sair com amigos e não beber, chegava a ser inconveniente e só consigo enxergar isso agora”, relata.
O processo
Daniela diz que foi um processo doloroso quando se deu conta do que estava acontecendo, pois sempre tinha enxergado alcoolistas com aquele estereótipo que a maioria das pessoas vê: uma pessoa sem rumo, que bebe diariamente e é improdutiva. Mas no caso dela, não bebia diariamente. Em algumas semanas, revela que quase não bebia e, em outras, bebia de maneira compulsiva e exagerada e, mesmo em casa, sempre tinha uma cerveja na geladeira.
“Avalio que o meu caso era muito mais sobre a quantidade que eu conseguia ingerir, do que a frequência. Eu poderia, facilmente, beber dois fardos de cerveja. Não era sempre, mas eu conseguia. E talvez, por ingenuidade, não me questionei que ninguém chega nesse nível [de alcoolista] de repente, existem estágios. Eu não sou uma pessoa improdutiva: trabalho, estudo, tenho uma vida ativa, mas o álcool se tornou um problema para mim”, diz.
Segundo Daniela, foram meses até admitir que tinha um problema, uma briga interna, que se agravava com o fato de ter pessoas da família que sofrem com esse problema em estágios bem mais avançados.
“Sinto saudades de uma pessoa que está na minha frente, mas que vive um duro problema com o álcool. E me enxergar nesse mesmo problema, mesmo que em um estágio “inicial”, doeu demais. Tenho alcoolistas graves dos dois lados da família, perdi um tio para uma cirrose, não é fácil”, desabafa.
Bebida e maternidade
Foto: @danimoraesbrum
Quando estava com os filhos, Daniela conta que tomava cerveja de forma mais moderada, mas aproveitava os momentos sem eles ou quando já estavam dormindo para poder beber mais. “Ficava acordada de madrugada sozinha, para poder beber”, lamenta.
A busca por ajuda
O primeiro passo antes de pedir ajuda, segundo Daniela, foi admitir que de fato tinha um problema e, a partir disso, começou a frequentar o Grupo Alcoólicos Anônimos, foi ao médico, iniciou a terapia e a prática diária de atividades físicas.
“Desde o fim do ano passado, já estava tentando reduzir, sem sucesso. O meu incômodo foi aumentando. Até que eu tive uma forte crise de síndrome do pânico. No dia 13 de março, fui parar no hospital, fiquei totalmente fora do ar por umas quatros horas e aquilo me fez refletir que eu precisava mudar o rumo da minha vida de verdade, não dava para ser pequenas mudanças, como eu já estava fazendo. Então, busquei ajuda, pois eu de fato tenho um problema. Eu amava tanto a cerveja que não me via sem ela e, por isso, encontrava tanta resistência.”
Superação e rede de apoio
Agora, Daniela faz parte de um grupo de AA apenas para mulheres. São reuniões on-line que ela afirma que tem ajudado muito, além de todo apoio que tem recebido da família e dos amigos. “Todas as pessoas ao meu redor vibraram com a minha decisão [de parar com a bebida] e permanecem me apoiando”.
Nesta semana, a produtora revela que completou 60 dias sem o álcool e diz que se sente muito melhor. “Me sinto sendo eu novamente. Tinha muito medo do amanhã, pensava muito no ‘nunca mais irei beber’, mas o que a gente aprende nos grupos de apoio é a viver o lema ‘Só por hoje’. Todos os dias eu acordo com o compromisso de não beber pelas próximas 24 horas, o amanhã é um compromisso da Daniela de amanhã”, diz.
Daniela afirma que a decisão de parar não é a coisa mais fácil do mundo e que está tomando remédios para tratar o que causava a vontade de beber, que é a ansiedade. “O dia parece que voltou a ter 24 horas, a vida voltou a ter mais graça, passei a apreciar mais os passeios sem ter medo de ficar sem a cerveja do fim de semana”, conta.
Para quem se identifica com o relato que fez, a petropolitana sugere não deixar que o problema se torne maior. “Quem te ama de verdade, estará ao seu lado e certamente irá te apoiar. Quem tem problema com álcool e continua bebendo, pode estar trilhando um caminho sem volta. É possível ter ótimos momentos sem a bebida, você não é careta por escolher viver. E lembre-se: só por hoje!”, conclui.