Cine Pagu: grupo formado por mulheres promove encontro entre a arte do cinema e alunos de Petrópolis
Cineclube e escola de cinema itinerante, grupo debate direitos humanos e igualdade social por meio da sétima arte
Por Cristiane Manzini sob supervisão de Luísa Abreu
A arte serve para questionar, apreciar, discutir, contemplar e trazer aos espectadores o sonho e a magia. A proposta do Cine Pagu é oportunizar a quem não tem acesso filmes que possam, de alguma forma, despertar a reflexão sobre assuntos tão pertinentes da nossa sociedade como os direitos humanos e as desigualdades sociais. Os alunos das escolas públicas de Petrópolis estão sendo provocados a debater e modificar a própria realidade através da exibição dos filmes.
CDDH (2022) – Foto Divulgação
O Cineclube
Cine Pagu é um cine clube itinerante e uma escola de cinema formados por mulheres de Petrópolis. Nascidas na cidade ou criadas aqui desde a infância, elas sentiram o desejo de oferecer aos petropolitanos a possibilidade de acessarem filmes que não são veiculados nas grandes redes de cinema.
A cineasta Beatriz Ohana, de 31 anos, é a Diretora Geral e Executiva do grupo. Juntamente com ela, a cenógrafa e estudante de Arquitetura Sophia Ázara, de 28 anos, coordena a curadoria do cineclube. A Educadora e Contadora de Histórias Miriam Santos, de 33 anos, Educadora popular e Contadora de histórias, coordena a parte pedagógica e Carol Guerra, cantora e atriz de 34 anos, comanda a Comunicação e Assistência de Produção.
Oficina Cine Pagu na escola (2019) – Foto Divulgação
Moradoras dos mais diversos bairros da cidade, conhecem de perto as necessidades de acesso à arte que os moradores têm.
Por que montar um cine clube em Petrópolis?
Em 2017, com o retorno para Petrópolis depois de um período de estudo e trabalho fora, Beatriz fez parte de um coletivo feminino. Como trabalhava com cinema e audiovisual, propôs que uma das atividades fosse um cineclube que exibisse filmes com temáticas relacionadas à vida das mulheres. E assim foi feito.
“Criei o cineclube como uma atividade do coletivo. Pouco tempo depois, o coletivo acabou, mas continuei os trabalhos com o Cine Pagu. Sempre contando com o apoio de amigos para sua realização, após alguns meses de atuação, o cineclube passou a contar com uma equipe fixa que teve diversos formatos, composta sempre por mulheres. Atualmente, o Cine Pagu conta com uma formação de quatro pessoas”, conta.
Estúdio Aldeia (2018) – Foto Divulgação
A razão do nome
Quando o cineclube foi criado, as mulheres que faziam parte do coletivo deram diversas ideias de nomes que se relacionavam com o feminismo de alguma forma. Depois de muito pensar, Beatriz resolveu que seria interessante dar o nome de uma mulher brasileira que fosse militante e artista, que fosse uma voz importante da cultura e do movimento político brasileiros.
“Na hora veio na minha cabeça “Cine Pagu”, por conta da Pagu, figura emblemática do movimento artístico e social do país”, relembra. Ela explica que o nome continua muito alinhado com os propósitos do cineclube, que promove discussões sobre direitos humanos, além de desigualdades sociais e econômicas da sociedade, todas prioridades da luta de Pagu.
*Pagu era o apelido da escritora e poetisa modernista Patricia Rehder Galvão (1910-1962). Jornalista e formada na Escola Normal, teve importante papel na luta pelos direitos humanos e sociais. Ícone feminista e militante política era uma mulher à frente do tempo.
Como funciona o cineclube itinerante?
O cine Pagu acabou de completar sete anos de atuação e já promoveu mais de 50 sessões de cine debate, sempre contando com a presença de debatedores pertinentes aos temas abordados. As sessões ocorrem normalmente no 1º distrito de Petrópolis em escolas, universidades, centros comunitários e de moradores, espaços culturais como o Centro de Defesa dos Direitos Humanos – CDDH e a Sala de Cinema Humberto Mauro, no Centro de Cultura.
“A sessão pode ser uma proposta avulsa do Cine Pagu ou pode fazer parte de um projeto maior”, explica.
Exibição Sala Humberto Mauro (2023) – Foto Divulgação
Os filmes escolhidos
Os filmes exibidos precisam, de alguma forma, tratar de direito humanos. Esta é uma condição básica para a exibição no cineclube. Em geral são filmes independentes, que não passam nos cinemas. A maioria é de filmes brasileiros, mas também tem latino-americanos. São normalmente curtas e médias metragens com debate na sequência.
“Os filmes devem ser abrangentes, com várias temáticas, para difundir a cultura cinematográfica”, destaca.
Projetos em 2024
Ao longo do segundo semestre de 2024, o Cine Pagu está atuando em três projetos paralelos. O “Circuito Cine Pagu de Direitos Humanos” fará exibições em escolas e no CDDH. Serão sessões de julho a dezembro para todos os públicos. Os filmes de curta e média metragens são realizados por petropolitanos. Além disso há os debates e as atividades a respeito.
A “Escola de Cineclube” propõe a formação cineclubista para alunos de quatro escolas do município. “Ao final do projeto, cada escola terá desenvolvido seu próprio cineclube. Eles serão lançados em sessões nas respectivas salas públicas de seus distritos”, conta Beatriz.
Estúdio Firma (2018) – Foto Divulgação
Além das exibições e das formações, o grupo ainda promove em 2024 a gravação de um filme chamado “Nosso nome, Resistência”. O filme, de média metragem, é dirigido por Mariana Rocha e produzido pelo Cine Pagu em parceria com a Associação de Moradores da Comunidade São João Batista. O filme, que será lançado em outubro, conta a história de luta e resistência da Comunidade São João Batista, no Duarte da Silveira.
Beatriz destaca que todos os projetos são realizados por meio de editais públicos da Lei Paulo Gustavo do município e do Estado. Na mesma comunidade onde está sendo feito o filme, no primeiro semestre do ano, o grupo promoveu um projeto de três meses unindo cinema e educação ambiental. Tudo isso só foi possível graças ao incentivo de leis como esta.
Desafios e Conquistas
A cineasta explica que conseguir realizar e produzir sem recursos é sempre um desafio. Somente este ano os projetos estão sendo feitos através de edital público e lei Paulo Gustavo. “Sempre usamos equipamentos emprestados e agora temos o próprio equipamento”.
Um projeto memorável é o “Cine Pagu nas escolas”, realizado em 2019 no Centro Educacional Comunidade São Jorge, no Bairro Independência, que trabalhou com 45 crianças de 8 a 14 anos. Foi um ano de trabalho dividido entre as formações em cineclube e audiovisual. O resultado, o filme “A incrível aventura das sonhadoras crianças contra Lixeira Furada e Capitão Sujeira”, foi um curta-metragem enviado para diversos festivais nacionais e internacionais de cinema. A ideia que veio das crianças recebeu 10 premiações e deu uma guinada no foco do cineclube, que passou a ser também uma escola de formação itinerante.
Crianças da gravação do curta metragem – Foto Divulagação
A Escola de cinema
A escola não tem um espaço físico definido. São projetos de formação em escolas ou formações audiovisuais em projetos específicos, menores, como em centros de moradores, por exemplo. Atualmente desenvolve a Formação Cineclubista (comandar um cine clube, entender o conceito e a importância para o acesso ao cinema independente) ou a formação em audiovisual (capacitação básica em conceitos audiovisuais de edição, captação, direcionamento de linguagem audiovisual e roteiro).
Equipe e debatedores do Cine Pagu (2024) – Foto Divulgação
Para o futuro
Segundo Beatriz, o maior desejo do grupo é ter, de fato, o Cine Pagu como escola de cinema gratuita que possa atender os alunos de várias regiões da cidade.
“Que realmente a gente ajude a construir o futuro de várias crianças e jovens através do audiovisual sempre pensando na perspectiva de oportunizar”, conclui.
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