Diminuição de alunos do ‘Curso Normal’ em Petrópolis ameaça futuro dos professores na cidade
Tradicional há décadas, a formação hoje é oferecida em apenas duas escolas da cidade
Por Cristiane Manzini sob supervisão de Luísa Abreu
Em Petrópolis, até meados dos anos 1990, o curso de formação de professores era oferecido como opção no Ensino Médio em várias escolas. Porém, com o novo milênio, as turmas foram sendo reduzidas e o curso quase deixou de existir. Hoje restam apenas duas escolas que ainda trabalham com esta modalidade: Colégio Estadual Rui Barbosa, no bairro Alto da Serra, e Liceu São José de Itaipava, no distrito de Itaipava.
Desde o surgimento no Brasil, a história da formação de professores no Ensino Médio teve altos e baixos. Começou a funcionar em 1835, em Niterói, porém teve inúmeras interrupções de acordo com as legislações em vigor e a procura dos alunos.
Foto: Arquivo Liceu São José de Itaipava
Curso técnico
Conhecido também como Magistério ou Formação de Professores dependendo da região do país, o Curso Normal é uma formação técnica que ocorre durante o Ensino Médio e prepara os alunos para serem professores.
Quando concluem os três anos, os alunos saem com um diploma que lhes permite trabalhar como professores da Educação Infantil e do 1º segmento do Ensino Fundamental em todo o território nacional.
Formandas do Curso Normal do Colégio D. Pedro à esquerda e uma formanda do Curso Normal do Colégio Santa Isabel – Fotos Arquivo Pessoal Janaína Martins e Cristiane Manzini
Muitos jovens que vão iniciar o Ensino Médio sequer sabem da possibilidade de fazer um curso técnico. Para Solange Cassador, coordenadora há dez anos no Liceu São José de Itaipava, isso pode ser um dos motivos que levaram à diminuição da procura pela formação.
“Os cursos técnicos, em geral, precisam ser divulgados e incentivados. Que mais escolas regulares ofereçam esses cursos integrados ao Ensino Médio. Falta o conhecimento das pessoas sobre eles”, ressalta.
Vale a pena fazer o Curso Normal?
Marilia D’Olne é coordenadora do Curso Normal no Colégio Estadual Rui Barbosa (CERB) há cerca de vinte anos. Ex-professora do curso, ela o considera uma boa oportunidade profissional para os jovens que estão ingressando no Ensino Médio.
Foto: Arquivo Colégio Estadual Rui Barbosa (CERB)
Mesmo para quem não deseja ser professor, vários aprendizados adquiridos durante o curso podem ser levados para outras profissões e para a própria vida.
“O aluno do curso normal é diferenciado. Vale a pena fazer o curso mesmo que ele não queira exercer a profissão. Ele pode não querer agora, mas é um curso que tem uma parte humana muito bem trabalhada”, destaca.
Fotos Arquivo Pessoal Cristiane Manzini
Solange concorda com a colega. Apesar do currículo de cada escola apresentar variações, há disciplinas que contribuem com importantes lições para o mercado de trabalho atual.
“No curso o aluno aprende muito a trabalhar em equipe e isso é essencial em qualquer carreira que se vá fazer. Isso faz com que se tenha respeito pela opinião do outro”, comenta.
As duas coordenadoras convergem em mais um ponto: os alunos que escolhem áreas relacionadas às Ciências Humanas apresentam um diferencial seja pela capacidade de lidar com o outro, pela maturidade desenvolvida nos estágios, ou ainda pelo conhecimento técnico de vários conteúdos exigidos nestes cursos.
“É visível a diferença daquele profissional que fez o curso normal e daquele que só fez Pedagogia”, destaca Solange. Para ela o Curso Normal deveria, inclusive, ser pré-requisito para fazer Pedagogia.
Dedicação e Empatia
Marília acredita que para buscar a formação é importante que o aluno tenha dedicação e esforço, já que no CERB o curso se desenvolve em período integral. Gostar de lidar com crianças, ter paciência e empatia também são características importantes para quem deseja se tornar um professor.
Já Solange, reúne inúmeras características em apenas uma: o olhar para o outro. O principal atributo para o curso é “estar voltado para a área humana, gostar de gente, querer estar e se importar com gente”, resume.
Diminuição da procura
O Curso Normal já foi bastante tradicional na cidade. Existe no Liceu São José de Itaipava desde 1968 e no CERB há 26 anos, mas já teve colégios como D. Pedro, Santa Isabel, e os extintos Werneck e Biblos oferecendo a formação até cerca de trinta anos atrás.
Formatura do Curso Normal do CeRB (2015) – Foto Arquivo Pessoal CeRB
Alguns fatores podem ter contribuído para a diminuição da procura dos alunos pelo curso nos últimos tempos. Para Marília, a redução tem alguns motivos.
A mudança das aulas para o horário integral fez com que os alunos não pudessem mais trabalhar enquanto estudavam. Outro fator foi a exigência do município pelo curso de Pedagogia para o ingresso no quadro de professores.
Os municípios vizinhos a Petrópolis ainda aceitam a formação dada no Curso Normal como requisito básico para aprovação em concurso, porém os jovens da cidade acabam achando que é uma formação sem utilidade.
As próximas gerações
Embora a quantidade de alunos em formação varie de ano para ano, é possível observar uma redução no tamanho das turmas.
Um ponto positivo é o aumento da procura dos meninos pelo curso. Nos anos 1990 as turmas eram quase totalmente femininas.
No entanto, não há muito o que comemorar quanto ao número de alunos. Em 2024, considerando as duas escolas que oferecem o curso, serão formados em Petrópolis apenas trinta professores, um contingente muito pequeno para uma população de quase 300 mil habitantes.
Solange aponta a falta de vontade dos jovens em serem professores, mas acredita que a diminuição de profissionais formados possa melhorar a situação.
“Daqui a vinte ou trinta anos a profissão ainda vai existir? Daqui a um tempo nós teremos um número muito pequeno de professores no mercado. Mas a gente sempre tem a esperança de que as coisas vão melhorar, que o governo vai ter um outro olhar para a gente, que vai melhorar as condições de trabalho. É o que eu espero”, comenta.
Formatura do Curso Normal do Colégio D. Pedro – Foto Arquivo Pessoal
Preocupação com o futuro do curso
Para Marília, o futuro do Curso Normal não apresenta uma boa perspectiva.
“Infelizmente acho que o futuro do Curso Normal está bem reduzido. A Secretaria de Educação vai ter que repensar sobre o futuro dele”, explica.
Mais otimista, Solange deseja que o Liceu continue oferecendo o curso enquanto for possível.
“A gente sempre vai precisar de professor”, justifica. Porém, apesar do otimismo, ela também demonstra preocupação quanto à formação dos professores a longo prazo.